Machine learning e AHP como ferramentas de identificação de pontos críticos para ocorrência de incêndios

As florestas são um componente importante tanto dos recursos naturais quanto do meio ambiente. São os ecossistemas mais amplamente distribuídos na Terra, caracterizados por espécies abundantes, estruturas complexas e recursos diversos. Sua grande capacidade de sequestrar carbono é fundamental na manutenção do equilíbrio ecológico, com impactos positivos sobre as mudanças do clima.

Os incêndios florestais descontrolados impactam em escala global a biodiversidade, habitats da vida selvagem e atributos de ecossistemas. Cerca de 84% das ecorregiões do mundo estão ameaçadas por incêndios florestais, com graves prejuízos para a biodiversidade. As florestas, pelo papel importante como sumidouros de carbono, seguem emitindo carbono para a atmosfera mesmo após os incêndios florestais, com a morte das árvores nas áreas queimadas.

De acordo com o Quinto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), as emissões anuais de carbono provenientes de incêndios florestais variam de 2,5 a 4 bilhões de toneladas de dióxido de carbono. A queima de florestas degrada a qualidade do ar devido à emissão de um grande volume de material particulado e de gases residuais. A degradação da terra por incêndios florestais é outro problema frequente. O grande volume de cinzas, carbono e substâncias tóxicas produzido por incêndios florestais polui o ar, a água e o solo, prejudicando nutrientes e microrganismos no solo, e sua produtividade.

A prevenção de incêndios é uma ferramenta essencial entre as políticas públicas para ajudar na redução dos gases de efeito estufa. De acordo com o National Interagency Fire Center, o custo médio de 10 anos de supressão de incêndios nos EUA é estimado em US$ 2.358.603.800. Nesse contexto, um mapa de risco de incêndio poderia ajudar os agentes responsáveis pelo combate a incêndios florestais a reduzirem a ocorrência dos mesmos, a um custo muito menor. A gestão do risco de incêndio começa com uma avaliação dos locais mais inflamáveis e as medidas necessárias para limitar seus impactos, especialmente quando se conhece o Risco de Incêndio Florestal (RIF).

Apresentamos uma metodologia que combina o aprendizado de máquina com variáveis associadas à ignição, dispersão e material combustível para a avaliação do RIF, para produzir mapas temáticos em alta resolução espacial (10 m) que identificam os locais críticos até o nível da propriedade – e pontos críticos para a ocorrência de incêndios. No contexto das mudanças climáticas, do desmatamento e dos incêndios na bacia amazônica, testamos e desenvolvemos nossa metodologia nos estados do Amazonas/Brasil, Portugal e no condado de El Dorado, na Califórnia, EUA.

Materiais e métodos

A pesquisa foi realizada em três áreas distintas:

1) Humaitá: município no estado brasileiro do Amazonas;

2) El Dorado: condado na Califórnia, EUA, que inclui a Floresta Nacional Eldorado; e

3) Belmonte: cidade na região da Serra da Estrela, em Portugal.

A metodologia sugerida foi desenvolvida com base em pesquisas anteriores e avaliou 12 fatores (fixos e dinâmicos), usando técnicas de aprendizado de máquina e o Processo Analítico Hierárquico (AHP) para determinar seus pesos no cálculo do RIF, usando um novo algoritmo. Os valores preditivos permitem que o RIF seja previsto para um período de até 10 dias pela atualização diária de alguns fatores (dados de nanossatélites). A Figura 1 mostra o fluxograma de processamento de dados usado para calcular o RIF e exibi-lo na plataforma Flareless.

Figura 1: Processamento do fluxo de trabalho

Discussão

Os mapas temáticos (RIF) dos três locais, levando em conta as datas, aparecem na Figura 2:

a) Belmonte: de 1º de julho a 31 de julho de 2022;

b) Humaitá: de 29 de julho a 28 de agosto de 2021; e

c) El Dorado: de 12 de agosto a 25 de setembro de 2021.

Figura 2: Risco de Incêndio Florestal para a) Belmonte, b) Humaitá e c) El Dorado.

Foram comparados os dados registrados com as cicatrizes de incêndio encontradas nos dias imediatamente após o cálculo, para confirmar a precisão dos mapas. O exemplo mais ilustrativo foi o de El Dorado, onde um alto risco identificado com até 45 dias de antecedência logo evoluiu para o Incêndio Caldor. Apresentamos o resultado desse cruzamento na Figura 3.

Conclusões:

Ao comparar áreas de risco alto e extremamente alto com cicatrizes de incêndio, a metodologia desenvolvida mostrou uma precisão de cerca de 80%. A precisão na identificação de áreas com risco alto ou muito alto de incêndio aumenta com o uso de dados meteorológicos precisos. As próximas pesquisas se concentrarão na determinação do Carbono Acima do Solo (CAS), aumentando assim a previsibilidade de incêndios perigosos e trazendo dados sobre o volume de CAS preservado.

Referências:

Parisien, M.A.; Miller, C.; Parks, S.A.; DeLancey, E.R.; Robinne, F.-N.; Flannigan, M.D. “The spatially varying influence of human on fire probability in North America”. Environ. Res. Lett. 2016, 11, 075005.

Tariq, A.; Shu, H.; Li, Q.; Altan, O.; Khan, M.R.; Baqa, M.F.; Lu, L. “Quantitative Analysis of Forest Fires in Southeastern Australia Using SAR Data”. Remote Sens. 2021, 13, 2386.

* Dr. Marcos Benedito Schimalski é Engenheiro Cartógrafo, Doutor em Ciências Geodésicas e Diretor de Pesquisa na Quiron; MSc. Bill Herbert é Engenheiro Florestal, Mestre em Engenharia Florestal, Pesquisador na Quiron; Roni Pavarin é Engenheiro Florestal e Pesquisador na Quiron.

Previous
Previous

Uma agenda positiva para o agro sustentável

Next
Next

Agropecuária de baixo carbono e resiliente como solução climática